Estudo de Ruptura Hipotética de Barragens

Artigos Técnicos

Estudo de Ruptura Hipotética de Barragens

Contexto Geral

Diante dos últimos rompimentos de estruturas a montante que ocorreram no Brasil, a atenção ao monitoramento da segurança das barragens aumentou. Sendo assim, com o objetivo de reduzir os riscos de novos acontecimentos, foram criadas legislações nacionais, estaduais e até municipais para fomentar as boas práticas de segurança de barragens no território nacional.

Dentro deste quesito, os estudos de ruptura hipotética obtiveram certo protagonismo ao apresentarem a situação prevista para as inundações provocadas por rompimentos. Ainda neste caso, a legislação também se aprimorou para atender e acompanhar guidelines internacionais e demandas da sociedade.

Neste cenário, é necessário ao profissional de geotecnia ou hidrólogo, o conhecimento dos efeitos de uma ruptura e os fenômenos que levam ao evento. O comportamento do fluxo a jusante também é importante para prever situações de potencial risco a pessoas, estruturas viárias, estações de captação de água, indústrias de materiais perigosos, entre outros. É neste contexto que se inserem os estudos de ruptura hipotética (estudo de dam break).

A elaboração de um estudo de dam break está diretamente relacionada ao dano potencial associado à ocorrência de ruptura e não ao risco efetivo da probabilidade de ocorrência. Este dano potencial está relacionado a perda de vidas humanas, impactos socioeconômicos e ao meio ambiente, e aos efeitos a outros barramentos no caminho da onda (rupturas em cascata).

O primeiro entendimento para formulação do estudo é sobre o tipo de barragem ao qual será feita a simulação. Em barragens de reservação de água, as boas práticas de engenharia pressupõem que sejam assumidas as seguintes hipóteses:

  1. A água se comporta como fluido Newtoniano;
  2. A saída de água do reservatório acontece em função do desenvolvimento do fenômeno de ruptura; e
  3. Todo o volume é mobilizado para o evento de ruptura, juntamente com o volume desprendido pela brecha.

No caso de barragens de rejeito, existe uma diferença de abordagem no estudo de ruptura. É necessário o conhecimento das propriedades geotécnicas e reológicas dos rejeitos contidos para entendimento do comportamento do fluido gerado. Neste caso, devem ser assumidas as seguintes hipóteses para as boas práticas:

  1. O volume de água contido no lago do maciço é livre, e é 100% deslocado com o rompimento;
  2. O volume de rejeitos mobilizados é estimado considerando a características do material;
  3. O volume do maciço mobilizado pela brecha é somado ao material mobilizado do reservatório.

Legislação e boas práticas de Engenharia

A Política Nacional de Segurança de Barragens (PNSB) ou Lei n° 12.334 (BRASIL, 2010)[1], traz que a ZAS (Zona de Autossalvamento) é o trecho do vale a jusante da barragem em que não haja tempo suficiente para intervenção da autoridade competente em situação de emergência, conforme mapa de inundação, e a ZSS (Zona de Salvamento Secundária) é o trecho constante do mapa de inundação criado pelo estudo de dam break não definido como ZAS.

A mesma Lei define o mapa de inundação como “produto do estudo de inundação que compreende a delimitação geográfica georreferenciada das áreas potencialmente afetadas por eventual vazamento ou ruptura da barragem e seus possíveis cenários associados e que objetiva facilitar a notificação eficiente e a evacuação de áreas afetadas por essa situação”. Para criação do mapa de inundação é pedido que se considere o pior cenário para a estrutura. Muitos destes pontos foram aprimorados também pela Lei n° 14.066 (BRASIL, 2020)[2], que veio complementar a PNSB.

No âmbito de barragens de mineração, a Resolução n° 95 (ANM, 2022), trouxe condições mais conservadoras para este tipo de barramento em função dos últimos rompimentos ocorridos no estado de Minas Gerais. A referida Resolução dá que, além do delimitado pela PNSB, a ZAS deve ser delimitada dentro do estudo de dam break com a adoção da maior das seguintes distâncias: a distância que corresponda a um tempo de chegada da onda de inundação igual a 30 minutos ou 10 quilômetros.

Sobre o mapa de inundação, a Resolução preconiza os seguintes tópicos:

  1. Deve ser detalhado e exibir gráficos e mapas georreferenciados das áreas a serem inundadas, explicitando a ZAS e a ZSS;
  2. Deve constar os tempos de viagem para os picos da frente de onda e inundações em locais críticos, abrangendo os corpos hídricos e possíveis impactos ambientais;
  3. Deve ser minimamente feito com modelos 2D contemplando o acréscimo de materiais que a onda carreará em seu deslocamento através da topografia atual e primitiva do reservatório.
  4. Deve considerar o maior dano que, se for por liquefação, deve levar em conta a totalidade do maciço e do volume contido no reservatório como volume mobilizável.
  5. Deve conter explicitamente o critério de parada da onda escolhido;
  6. Deve mostrar residências, comunidade indígenas, infraestruturas viárias, equipamentos urbanos (escolas, hospitais, creches, entre outros), indústrias com potencial de contaminação, postos de gasolina, estações de tratamento e captação de água e esgoto, depósito de materiais químicos, patrimônio cultural, artístico, histórico e arqueológico, além de unidades de conservação.
  7. Deve refletir o estado atual da barragem conforme a sua cota licenciada.

Muitos aspectos devem ser considerados nos estudos de dam break, tais como: hidrológicos, reológicos, geotécnicos e definição de modos de falha. Com base nesses aspectos, você terá um entendimento geral para iniciar seus estudos sobre ruptura hipotética a partir do conhecimento da legislação de segurança de barragens vigente e dos estudos mais reconhecidos com aplicabilidade para a formação da simulação. É importante ter em mente que os mecanismos de falha devem ser aplicados com cuidado, sempre buscando evidenciar com dados a escolha do modo de falha para o cenário mais crítico como pede a legislação.

 

Gostou do assunto? 

Se você se interessa pelo tema e quer se especializar nessa área, confira os cursos que preparamos:

Estudo de Ruptura Hipotética de Barragens e Modelagem Computacional

Estudo de Ruptura Hipotética de Barragens e Modelagem Computacional nos Softwares HEC-RAS e HEC-HMS

Referências

[1] BRASIL. Lei n° 12.334 de 20 de setembro de 2010. Estabelece a Política Nacional de Segurança de Barragens. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2007-2010/2010/lei/l12334.htm.

[2] BRASIL. Lei n° 14.066 de 30 de setembro de 2020. Altera a Lei nº 12.334, de 20 de setembro de 2010. Estabelece a Política Nacional de Segurança de Barragens (PNSB). Disponível em: https://www.in.gov.br/en/web/dou/-/lei-n-14.066-de-30-de-setembro-de-2020-280529982.